Artigo do economista CLÓVIS PANZARINI, publicado no "Estadão" - UM ARTIGO QUE EU GOSTARIA DE TER ESCRITO.
Mísero vintém foi a gota dágua no copo dos malfeitos produzidos cotidianamente pelo despudor dos poderes constituídos. O governo não percebeu que em algum momento a farsa marqueteira perderia eficácia.
Cooptava a base da pirâmide social com Bolsa
Família e o ápice, com "Bolsa BNDES", empanturrando os abastados com
empréstimos a juros subsidiados pelo Tesouro. E a classe média surfava
no pleno emprego. Na área política, cooptou - sabemos todos como -
enorme base aliada, cujo comportamento ético ruborizaria qualquer
petista modelo 1990. Esse aparente mar de tranquilidade alimentou a
arrogância do governo, cuja única agenda era a perpetuação no poder.
A sociedade passou a ser tratada como mero
detalhe, supostamente iludida por lindas imagens da propaganda oficial,
que alardeava uma Suíça morena, enfeitada por sorrisos de crianças bem
nutridas e olhares agradecidos de pacientes em hospitais-modelo. Porém,
na outra ponta, tinha um povo padecendo em macas nos fétidos corredores
hospitalares, espremido como gado em ônibus lotados e massacrado pela
bandidagem fora de controle.
Enquanto a economia andava bem, engolia
tudo. Mas, de repente, ela começou a patinar pela gestão incompetente
que fez o Brasil perder a extraordinária janela de oportunidade aberta
pela bonança internacional. Desprezando princípios elementares de
economia, o governo imaginou que o País pudesse crescer indefinidamente
via incentivo ao consumo (à demanda) - com juros baixos, crédito fácil,
tarifas congeladas, etc. - e desincentivo ao investimento (que gera
oferta). Tratava o investidor privado (o que produz os tais bens e
serviços de consumo) como inimigo, impondo margens, tarifas e outros
discursos com viés ideológico. De outro lado, os inexpressivos
investimentos públicos - por falta de recursos e de gestão (no ano
passado representaram ridículo 1,36% do PIB) - deixavam a infraestrutura
arruinada. A responsabilidade fiscal foi relegada a segundo plano, com
gastança desenfreada, de um lado - 39 ministérios, estádios, abjetas
mordomias, amantes de autoridades viajando com dinheiro público, etc. -,
e redução de impostos sobre bens de consumo, de outro.
As contas públicas se esgarçaram: nos
últimos 12 meses os juros da dívida nos três níveis de governo
consumiram 4,81% do PIB (14% da carga tributária), enquanto o superávit
primário representou apenas 1,89% do PIB. Apesar da "contabilidade
malandra" (o verdadeiro número é pior), faltaram 2,92% do PIB para pagar
os juros.
A política econômica populista perdeu - se é
que algum dia teve - completamente o rumo. As contas externas estão
perigosamente entrando no vermelho (déficit nas transações correntes de
US$ 39,6 bilhões até maio); a atividade econômica, patinando; a Bolsa de
Valores, derretendo; as tarifas públicas, defasadas (quebraram a
Petrobrás); e a inflação, escapando do controle, corroendo salários.
O consumidor/eleitor estava feliz, mas
quando a conta não fecha a inflação acorda e faz barulho. Os tais R$
0,20 foram o gatilho da explosão social que colocou a moçada nas ruas e
pegou o governo no contrapé do constrangimento orçamentário. O passe
livre em ônibus, metrô e trens, essa utopia infanto-juvenil, apenas na
capital paulista custaria R$ 14 bilhões/ano (4,4 bilhões de bilhetes/ano
a R$ 3,20 - só a Prefeitura gastaria 52% da receita tributária orçada
para 2013). Em todo o País, o passe livre custaria quatro vezes mais.
Haja aumento de impostos (mais passeatas!) para pagar a festa.
Os "pactos" anunciados pela presidente Dilma
Rousseff parecem ter sido redigidos pelo marqueteiro de plantão. Um
deles vincula à educação a receita de royalties sobre petróleo que ainda
não existe (a produção massiva do pré-sal vai demorar, ainda, muitos
carnavais). O da mobilidade urbana promete mais R$ 50 bilhões (um
trem-bala!), sem explicitar fonte e sem sequer se constranger com a
"briga" com outro "pacto", o da responsabilidade fiscal.
Marilena Chauí, ideóloga do PT, em evento do
partido em maio deste ano, chamou a classe média brasileira de
"violenta, fascista e ignorante". Vislumbrou que ela faria os poderosos
tremerem. Especialmente os seus amigos de Brasília.
* CLÓVIS PANZARINI É ECONOMISTA E SÓCIO-DIRETOR DA CP CONSULTORES ASSOCIADOS LTDA. SITE: WWW.CPCONSULTORES.COM.BR.
Nenhum comentário:
Postar um comentário