sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Herança Bendita?

Na última sexta-feira, a presidente eleita Dilma Roussef (PT-RS), falando em São Paulo para o seu partido, exaltou que receberá do governo de Lula da Silva uma “herança bendita”. É claro que ela não falaria de outro modo, pois, afinal, o presidente Lula da Silva, além de seu criador, foi o grande fiador de seu nome junto ao eleitorado.
Mas, na verdade, essa “herança bendita” nada tem de bendita, da forma como disse a presidente eleita. Quiçá seja ela a verdadeira herança maldita! A realidade é que o país que Dilma Rousseff assumirá é muitíssimo pior do que o herdado por Lula da Silva do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC).
Uma coisa é a propaganda de governo; outra coisa é a realidade fria dos fatos e dos números! Mas, nem tudo são flores, como os governos populistas sempre querem fazer que os seus “súditos” creiam. Eles podem enganar a maioria, por boa fé e falta de informação, mas a liberdade da democracia oferece a janela da verdade, que sempre prevalecerá mais cedo ou mais tarde.
Contudo, a situação atual da economia do nosso país - com exceção do nível das reservas, resultante dos preços favoráveis das nossas commodities no mercado externo, principalmente influenciado pelo consumo da China, e do emprego - não é nada confortável. Pelo contrário, está muito longe de ser essa “herança bendita”.
É oportuno fazer algumas comparações, que possibilitarão aos leitores uma análise entre as duas situações: quando Lula da Silva assumiu, e a herança que ele deixa para a sua sucessora. Resumidamente, apontamos os seguintes pontos:
- No final do governo de FHC a balança comercial brasileira consolidava um ciclo virtuoso, com o aumento das exportações, em função do câmbio flutuante e da valorização dos nossos produtos no mercado externo. A equipe econômica já minimizara o efeito Lula, que alvoroçara o mercado.
- Hoje, o real valorizado encarece os nossos produtos no mercado externo. Assim, o resultado da balança comercial brasileira é cada vez mais desfavorável; as exportações diminuem e as importações aumentam de maneira descontrolada. As nossas indústrias entraram em um processo de estagnação da produtividade.
- Com o desequilíbrio da balança comercial, passamos a depender ainda mais do capital externo para fechar as contas. Por isto, atualmente recebemos mais capital especulativo que no período anterior.
- Saímos de um sistema de controle de gastos, para o de gastança descontrolada, principalmente pelo aumento da máquina pública. São contratações desenfreadas de funcionários, aumento da burocracia de Estado e baixo nível de poupança para realização dos investimentos necessários.
- O consumo do governo saltou de 4,2% para 8,8% do PIB, enquanto os investimentos não passaram de 1,6%, também do PIB, mesmo com a injeção de recursos no BNDES, para financiamento das empresas.
- A carga tributária aumentou de 32% para 36% do PIB, para fazer frente ao aumento dos gastos do governo.
- Em 2002, a dívida externa era de UR$ 215 bilhões e a dívida bruta de R$ 1,1039 trilhão. Atualmente, a dívida externa é de US$ 254,1 bilhões e a dívida bruta estimada em R$ 2,450 trilhões, para final de dezembro de 2010.
- Em 2002, o Lucro dos bancos foi de R$ 32 bilhões; ao final de 2010 está projetado em aproximadamente R$ 167 bilhões. A concentração de renda no país não sofreu mudança significativa e mais da metade dos empregos ainda é gerada na economia informal.
Não falaremos aqui da política do “toma lá dá cá”, das 59% das residências sem esgoto, dos maiores juros do mundo, do assistencialismo compra-votos sem porta de saída, da falta de infraestrutura, da qualidade da educação, do retrocesso da saúde, da quebra dos valores éticos e de muitas e muitas outras coisas.

Talvez essa “herança bendita”, a que a presidenta eleita se referiu, não seja o Brasil real que ela assumirá no próximo dia primeiro de janeiro. Pode ser que seja a de um país imaginário, conforme propagado pelo presidente Lula da Silva - “como nunca se viu na história deste país”- que ela continuará a propagar nos próximos quatro anos de seu governo.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Descortinando o rio...

Há algum tempo, Jô Soares, em entrevista ao escritor cachoeirense Ricardo Marcondes, recordou que em viagem para Guarapari, resolveu entrar em Cachoeiro de Itapemirim para conhecer a cidade; depois, comentando essa visita com Rubem Braga, disse que “Cachoeiro de Itapemirim era uma cidade feia”, e que, então, Rubem respondeu: “- Jô, nenhuma cidade que tem um rio que a corta ao meio é uma cidade feia”.
Esta resposta de Rubem Braga ficou na minha memória. Nunca a esqueci! Guardo-a não só pela beleza da expressão, como também pela forma de sentir o sentimento de um poeta e sua maneira singular de ver a beleza nas coisas que lhe vão mostrando a vida. A partir daí, passei, então, a admirar ainda mais Rubem Braga, além do cronista, pela sensibilidade humana.
Agora, relembrando a repentina visita do Jô Soares a Cachoeiro, me vem à memória que ele talvez não tenha percebido o rio que banha a nossa aldeia, o nosso Itapemirim, – que me permita o leitor lembrar aqui Fernando Pessoa - e que, por isto, tenha sido infeliz na forma de ver a nossa cidade. Pode ser, também, que ele não estivesse em um bom dia...
Mas, acho mais plausível a primeira hipótese, pois há anos o Itapemirim vem sendo encoberto. São prédios e mais prédios escondendo as suas margens; outdoors colocados, indiscriminadamente, por todos os lados; caminhões de fretamento ao longo do pequeno trecho urbano ainda descoberto; matos e sujeira que encortinam a visão do leito, como na Volta do Caixão; são tantos os descasos acumulativos das autoridades e anos e anos de desleixo com o nosso rio.
Por isto, seriam boas e oportunas mais iniciativas, tais como a proibição de novas edificações às margens do rio, a desapropriação de terrenos ainda vagos, como os de perto do Liceu, e até mesmo a decretação de áreas de utilidade pública, para futuras desapropriações. Vale a pena pensar grande e pensar lá na frente. Pensar em ver o rio de volta, com suas belezas sendo colocadas para a apreciação de todos.

Outras iniciativas são de educação. É lamentável ver entulhos jogados às margens do rio e o descaso da própria população. Falta a alguns a sensibilidade para respeitar e preservar o que nos presenteou a natureza com que ela tem de mais lindo.
O mesmo acontece com relação aos outdoors e aos caminhões estacionados ao longo do rio; todos esses fatos têm a agravante da conivência do poder público.
Vale também lembrar, que no passado as construções eram feitas com as costas voltadas para o rio. A frente ficava para a rua, sem vistas, sujeita a barulhos e poluição. Mas a beleza deve ser vista de frente! O rio e as suas ilhas não podem ser colocados em segundo plano, nem as garças e os outros pássaros que fazem nele os seus habitats.
(Se eu tivesse uma casa às margens do rio, colocava a varanda em sua frente. Assim, poderia contemplar permanentemente a paisagem e observar os pássaros nas suas chegadas e partidas. Lá teria uma rede para as leituras e uma mesa com o notebook para a redação destes artigos, com todo sossego que isto me permitiria).
O rio Itapemirim tem que respirar a vida; por isto vibro com o trabalho de despoluição feito pela concessionária de serviços de água e de esgoto da nossa cidade – atualmente Foz do Brasil. Podemos, assim, observar que a qualidade da água está se recuperando.  Hoje temos menos poluição e mau cheiro. Falta é o replantio das matas ciliares.
Pelo amor a Cachoeiro e ao Itapemirim tenho certeza que Rubem Braga aprovaria as sugestões ora apresentadas. Também não tenho nenhuma dúvida que em nova visita a nossa cidade, Jô Soares a consideraria muito mais bela.
O rio Itapemirim não foi só da geração de ontem, como é da geração de hoje. Temos que cuidá-lo com muito esmero porque ele é também o rio de muitas e muitas gerações que virão pela frente.