No
último domingo bem de noitinha, lá pelas oito, todos procuravam por ele,
preocupados, até que a filha, Conceição, resolveu perguntar aos vizinhos se
havia algum jogo do Cachoeiro. Ele havia saído desde à uma da tarde, sem dizer a ninguém em casa aonde
ia. Entretanto, não deixara de passar na casa da vizinha, com o seu ioiô
escondido debaixo do casaco, dizendo ir disputar um campeonato no Shopping Sul.
Aquela
era a pista que faltava. Realmente foi lá no Shopping Sul, por volta das nove,
que ele foi encontrado. Estava terminando o campeonato, que por apenas uma
manobra fora eliminado, creio que em quarto lugar. Segurava em uma das mãos um certificado de participação;
na outra, o prêmio da classificação: um ioiô novo. No peito, orgulhoso, uma
medalha. Assim, com muita alegria, ele retornou para casa.
Tudo
até seria normal se o Senhor Silvino Santana não tivesse os seus bem vividos 88
anos de idade. Contudo o “Seu Vivinho”, como ele é chamado, há muito tempo
resolveu parar de envelhecer; não dá mais bola para idade. Como seu vizinho,
sou testemunha!
Em
nossa rua, no Baiminas, Seu Vivinho é muitíssimo estimado. Todos o consideram
parte da própria família. Ele mesmo diz, emocionado, que além das crianças,
muitos adolescentes e adultos o chamam por “Vovô Vivinho”. É que ele participa
ativamente da vida da rua. Ora brincando com as crianças, ora compartilhando
sua juventude com os adultos.
Além
da habilidade com o ioiô, Seu Vivinho tem ainda uma destreza fabulosa com o
manejo do pião, quer no aparo com a mão, ou no arremesso com a linha. A única
coisa de que reclama da vida, por suas próprias palavras, é que “sempre faltou força
nos dedos para jogar direito a bola de gude”.
Porém,
Deus lhe recompensou dando-lhe agilidade nos dedos e um fabuloso ouvido, para
realizar sua maior paixão, que é a de tocar flauta. A perfeição é tanta, que
não há quem não goste! Seu repertório é muito bem selecionado: Tico-tico no
fubá, Urubu Malandro, Na Glória, Vale Tudo, Meu pequeno Cachoeiro... Por isto,
também é conhecido por “Seu Vivinho da Flauta”.
Com
muito orgulho ele recorda ter tocado para o ex-governador Paulo Hartung, no
aniversário do nosso atual prefeito, Carlos Casteglione, em inúmeros eventos,
solando flauta ou na percussão, quando integrava a famosa orquestra do maestro
José Nogueira.
Mas,
de profissão era foguista. Em 1942 ingressou na extinta Estrada de Ferro
Itapemirim. Colocava lenha na caldeira da Maria Fumaça, que fazia a linha
Cachoeiro de Itapemirim -Marataízes. Eram quatro horas de ida, mais quatro
horas de volta na boca da fornalha. Assim foi até 1968, quando a estrada de
ferro foi extinta. Então, foi transferido para o Colégio Newton Braga, onde se
aposentou em 1984.
Ainda
menino participava da colheita de café junto à sua família, lá pelas roças do
atual bairro São Geraldo. Naquela época também gostava de pescar piau, cascudo,
robalo e tainha, que havia em abundância no rio Itapemirim.
(Agora,
em segredo, conto apenas aos leitores e leitoras desta coluna: com seus 88
anos, Seu Vivinho ainda desperta o ciúme de sua zelosa esposa, Dona Nicinha,
com que está casado mais de 60 anos).
Creio
que daqui alguns anos, quando Seu Vivinho resolver a envelhecer, que ele não
perderá a jovialidade. Nem a simpatia, a
alegria e o riso tão peculiares, que carrega por toda parte. Este sim deve ser
chamado por Sua Excelência. Sua Excelência, Seu Vivinho.
Bom exemplo de vida.
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