Quando o
príncipe herdeiro D. João decidiu pela tomada da Guiana Francesa, em 1808, em
represália à invasão de Portugal por Napoleão, a preparação da expedição
militar para a invasão de Caiena por terra concentrou-se no Grão-Pará. O
efetivo das tropas de linha de frente contava então com 800 homens. A população
do Grão-Pará, que incluía o atual Amazonas, somava quase 90 mil habitantes, enquanto
a cidade de Belém não passava dos 25 mil. Pode-se mensurar, portanto, que o
contingente das tropas egressas do Grão-Pará era bastante expressivo.
Integravam
as fileiras luso-paraenses soldados das mais diversas etnias. Brancos, negros,
índios, mestiços e tapuios, isto é, descendentes de índios que moravam em cabanas
espalhadas pelo estuário do Amazonas em condições de grande pobreza. O baixo
valor do soldo e os constantes atrasos dos pagamentos tornavam a carreira
militar pouquíssimo atrativa. Isto obrigava as forças regulares a apelar para o
recrutamento forçado, o que gerava grande terror à população civil. Os postos
de comando invariavelmente destinavam-se aos oficiais de origem portuguesa.
Durante o
período de ocupação da Guiana (1809-1817) intensificou-se a comunicação e a
movimentação de tropas entre Caiena e o Grão-Pará. Belém também passou a ser um
importante interposto das tropas que vinham do Ceará, de Pernambuco e do Rio de
Janeiro. Segundo a historiadora Magda Ricci “só em 1809 o rei mandava ir de
Pernambuco ao Pará 800 homens do regimento de artilharia. Esses, de fato, se
apresentaram em Belém com reforço constituído por recrutas cearenses”.
Outro fato marcante
é que o Grão-Pará passou a interagir com mais efetividade com Rio do Janeiro,
agora sede do reino e residência oficial da família real portuguesa. Antes todo
intercâmbio paraense estava restrito à Lisboa.
É nesse
movimento constante que foi transposta de Caiena uma grande coleção de
especiarias e espécies frutíferas, que seriam introduzidas no Grão-Pará,
Pernambuco e no atual Jardim Botânico no Rio de Janeiro. Entre os sacarídeos
veio a “cana-caiana”, hoje muito difundida em nossa cultura. Mas, além das
espécies botânicas vieram também as idéias do iluminismo. Ainda aflorava na Guiana
a revolução escrava (1791-1804) que tornara independente o Haiti, depois da
morte de mais de 24 mil brancos e 100 mil escravos. Muitos dos colonos franceses
haviam buscado refúgio na Guiana.
Quando, por
fim, as tropas luso-paraenses regressam da Guiana o constitucionalismo espraiava-se
por toda Península Ibérica e D. João VI era forçado a retornar a Portugal. Tudo
isto marcaria profundamente a vida social e política do Grão-Pará, depois de
1817. Se ante o magnífico esforço de guerra contribuíra para união
luso-paraense, a concentração de poder e riqueza na mão da minoria portuguesa,
agora associada a estrangeiros, sobretudo a ingleses, despertaram um sentimento
de ódio, já que a maioria da população vivia em condições miseráveis.
Para os
paraenses a solução dos problemas sócio-econômicos estava na criação de uma
nova República. Só assim julgavam possível diminuir o poder político das
classes dominantes. Os negros buscavam a abolição da escravatura, conforme nas
colônias francesas, enquanto os índios e os mestiços lutavam por não ter que
trabalharem tais como escravos, sem qualquer forma de direito. As idéias
libertárias espraiavam-se por toda bacia amazônica, singrando por todas as
partes.
Ao final de
setembro de 1822, quando chegou a Belém as primeiras notícias de que o príncipe
herdeiro D. Pedro havia decretado a independência do Brasil de Portugal, o
sonho de liberdade do Grão-Pará ainda pulsava enormemente.
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