Creio que não se pode mais chamar Marcão de pão-duro, pois o tratamento que ele anda fazendo, por indicação da esposa, parece estar dando certo. Eu mesmo comprovei com meus próprios olhos, que depois de meses de planejamento, utilizando fórmulas próprias de economia doméstica, Marcão finalmente comprou um par de tênis, novinho!
Foi ele mesmo quem me mostrou no final dos exercícios na academia. Só que agora, lembrando... Ele não calçava os tênis! Eles estavam embalados em uma sacola preta. Então me pergunto: - Será que era só para protegê-los contra os atritos na rua e as intempéries? Ou para não gastá-los? Ou será que Marcão teve alguma recaída?
Como ele está em tratamento, creio que esta última hipótese não é a mais plausível. Ah...! Também tem o testemunho de uma amiga, que diz ter visto Marcão cuidando das unhas, no mesmo salão de beleza que ela aprontava os cabelos. Cuidar das unhas em salão não é hábito peculiar aos pães-duros, que sempre abdicam da vaidade para guardar dinheiro, de modo que fico com a primeira hipótese.
Mas é que a dificuldade dele de gastar dinheiro era tanta, que a gente às vezes volta a ficar na dúvida! Que me perdoe Marcão, se por acaso fiz aqui um mau juízo, mas, afinal, como ele mesmo conta, a herança é tanto materna, como paterna; é fortíssima!
Para que não haja desconfiança e que alguém diga mais tarde que estou exagerando, vou abdicar de falar do medo que Marcão tem de elevador, para falar da sua mãe e do seu pai. Portanto, não falarei nada sobre o pavor que lhe dá só em ver um elevador. Nem do esforço que faz quando escala de escada do térreo ao décimo quarto andar, para ir direto ao assunto.
Quando Marcão e a esposa resolveram comprar um mobiliário novo para sala, decidiram que o velho seria presenteado à mãe, já que a sala dela estava quase vazia. Estava todo em perfeito estado!
Montados os móveis, ficou tudo uma beleza! Depois de algumas semanas, no entanto, em visita à mãe, Marcão se espantou com a sala vazia, do mesmo modo de antes. Então perguntou: - Mamãe, onde foram parar os móveis que te demos? Ela respondeu: - Marcão, eu vendi...
Na verdade ela gosta tanto de guardar dinheiro, que sempre preferiu ir à janela perguntar a hora aos vizinhos ou aos transeuntes na rua a comprar um relógio. Por ser assim, encontrou o esposo certo!
O pai, quando Marcão e os irmãos ainda pequenos, juntava os jornais que lia e ia empilhando-os direitinho, para que ficassem bem arrumados. Depois passava um barbante bem amarrado nas pilhas e as transformava em fardos. Chegado o verão, quando todos iam passar férias em Marataízes, ele trocava os jornais por peroás, que naquela época ainda eram muito baratos.
Assim, do início ao final das férias, todo dia na casa de Marcão era peroá; tanto no almoço, como no jantar. Ele conta que não agüentava mais comer o peixe, mas na volta das férias tinha sobrado peroá para mais um mês...
O pai tinha tanta dificuldade para gastar dinheiro, que quando Marcão precisou usar óculos, mandou que fossem feitas apenas as lentes; aproveitou a armação herdada da mãe. Por isto Marcão usou os óculos da avó por muitos e muitos anos.
Todos os amigos do Marcão torcem para que o seu tratamento com a psicóloga seja exitoso, mas que ele nunca perca o bom humor que leva para todos os cantos; nem a sinceridade, quando diz: - Eu não sei o que teria sido de mim se não tivesse encontrado a Gina, minha esposa.
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