sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Senhor Mr. Azar


Pode até parecer que é da imaginação o que ora conto. De antemão, então, vou logo avisando: é trágico, mas tudo é pura verdade. Sei que seria melhor que fosse apenas cômico. Mas, não! Que me permita Nelson Rodrigues: “A vida tem dessas coisas”.
O caso é que o Senhor Mr. Azar sempre falou de voz grossa, que jamais aceitaria o mando de um patrão e ser empregado. Decididamente, diz que não nasceu para ser mandado. Assim, não deixa dúvida a seus interlocutores sobre sua determinação e a força do seu caráter.
Creio, firmemente, sem qualquer vacilação, que Zeca Baleiro fez a canção “Eu despedi o meu patrão” dedicada a ele. Pode até ter usado da telepatia, mas foi tudo certinho, a começar da primeira estrofe: “Eu despedi o meu patrão/ Desde meu primeiro emprego/ Trabalho eu não quero não/ Eu pago pelo meu sossego...” É o próprio Senhor Mr. Azar falando, desde o início ao fim da letra.
Despedido o patrão e escusado emprego, restou-lhe, então, o trabalho autônomo para sobrevivência. Daí a realização de pequenos biscates e a catação de ferro-velho, quando a coisa anda apertada. 
Nessas idas e vindas, Senhor Mr. Azar conseguiu um trabalho de colar painel de outdoor. Foi quando lá em Marataízes, depois de estar na escada removendo o painel velho com a espátula, que ele se viu traído por uma rajada de vento. Foi tão forte que o derrubou com a escada no chão e fez soltar-se da estrutura uma das peças de madeira, que lhe acertou a cabeça. Foram dezenas de pontos, com direito a Raio X, tomografia  e observação de dias no hospital.
Em outra vez foi refazer uma cerca de madeira em uma fazenda, que separava o sítio das galinhas da área de pastagem. Lembro-me perfeitamente dele narrando: - quando olhei o galo, o galo já estava olhando para mim. A partir daí, disse ele que começaram as esporadas, por todos os lados do corpo; que corria e o galo pulava... que pulava e o galo esporava... que voltava e o galo em cima... que gritava e o galo não parava... que, machucado, conseguiu fugir, mas deixou a cerca como havia encontrado.
Também teve um domingo, quando na minha casa chegou o Senhor Mr. Azar com a esposa, querendo solução para uma mordida de cachorro. Tinha sido na parte traseira, do lado direito da região do assento. O cachorro não era vacinado; precisava tomar antirrábica. Na época, era eu secretário municipal e o Centro de Saúde estava fechado.
Mas, para ele, já não tinha valido a pena a caixa d’água da casa do cachorro bravo, pois não houve dinheiro e saiu quase dilacerado. Por isto, lembro que falava: - com patrão, galo e cachorro bravo, eu não quero nada!
Depois teve a história da mão infeccionada - já estava quase sem movimentos, e precisava de assistência médica urgente. Felizmente, conseguimos solução, inclusive com correção plástica.
(Para os curiosos, informo que foi catando ferro velho pelas ruas da nossa cidade).
Há tempo não vejo o Senhor Mr. Azar, mas há dias minha esposa o viu vendendo bolsinhas em uma banca de camelô. Então, aqui comigo, penso e desejo que dessa vez ele tenha mais sorte nessa sua empreitada.

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